Não quis fazer pediatria porque tenho pena de ver criança doente. Hoje, tive que dizer a alguém de 13 anos que nunca mais ela vai poder comer açúcar e que ela vai ser furada todos os dias. Depois, atendi alguém que mal aprendeu a andar e que está com suspeita de leucemia. Saí do trabalho e encontrei outra que ainda nem anda e que quase morreu de desidratação por diarréia e pneumonia, com mãe negligente, e que já teve outra pneumonia depois da alta e não está ganhando peso como deveria.
Em todos esses anos de prática médica, perdi uma paciente com 16 anos, que já estava em estado terminal quando a conheci, com câncer de ovário e um recém-nascido, que já estava com septicemia quando me pediram para socorrer. Uma vez, tive que dar a notícia da morte de uma menina pra mãe. Eu era só a clínica do plantão e ela ficou tão agressiva que precisamos chamar a polícia. Eu entendi, de verdade. A menina havia sido levada várias vezes à emergência da cidade em que vivia e não fizeram nada. Agora estava morta e a mãe estava revoltada, chutando as portas. Eu tive vontade de me juntar a ela, pra ser sincera.
Não, eu não nasci pra ver crianças doentes. E, definitivamente, não consigo vê-las mortas.
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