quarta-feira, outubro 22, 2008

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"Terça-feira, Fevereiro 15, 2005

Pegando o jeito

E não é que eu estou estudando? "Afecções do recém-nascido" e "Hepatites Virais". Eita! Deixa eu enviar o teste comentado pro meu professor de Gastroenterologia porque faz duas ou três semanas que prometi enviar.

Depois que você sai da faculdade, estudar não é mais a mesma coisa. Exceto se você emendar de cara com uma pós-graduação e se enfiar no meio acadêmico. Jamais acreditaria que eu, uma traça de livros, não estaria todo dia estudando. Na verdade, eu estudo. Não se passa um dia que eu não leia algo novo, mas não necessariamente Medicina. Agora eu estudo pelo simples prazer de saber, coisa que a faculdade havia tomado de mim. Dá pra acreditar que até entrar na faculdade eu estudava pelo prazer de aprender? Pois é, a dificuldade em me fazer estudar era se eu não encontrasse aplicação prática pra o assunto. Regra de três inversa, por exemplo. É aramaico. Já estequiometria era um sonho, e todo mundo detestava.

Eis o que uma faculdade de Medicina fez comigo: estudar por obrigação. Um pesadelo. Aliás, existem projetos e mais projetos para reavaliação do currículo médico. Fazem a gente decorar cada coisa teórica, o detalhe da exceção, o nome antigo e o atual do mesmo músculo, do mesmo osso. Você sai sabendo o Ciclo de Krebbs e não lembra da dose de antibiótico para o tratamento da pneumonia no recém-nascido. Tem que consultar o livrinho de "Medicamentos Habitualmente usados em Pediatria" (Deus abençoe a Nestlé que edita o manual!).

O mais perfeito exemplo, na minha humilíssima opinião, chama-se "Memórias de um médico interno", de Robin Cook. Ali você lê, e não acredita, no que fazem conosco (não conseguiram comigo): despersonalizar o médico, desaprender a interagir com o paciente como pessoa e vê-lo como doença. O rapaz era tão humano no começo do livro e acaba...um médico."A cidadela", de Cronnin, também mostra isso. Da falta de apoio ao médico formado, isolado na cidadezinha de interior, sem recursos pra se manter atualizado. E olha que a história é do século 18! Não mudou muita coisa. Aliás, piorou.

Falando nisso, eu vou me deitar porque daqui a quatro horas eu pego um ônibus que roda duas horas e meia, pra dar plantão 24 horas, pegar o ônibus de volta, descer em outro hospital, dar mais 24 horas de plantão e não ter dinheiro nem pro cinema esse mês. E a prefeitura de Santa Cruz "esqueceu" de pagar aquele plantão que dei com o falso médico. Ainda tem essa: concorrência desleal. "

Se alguém se der ao desumano trabalho de realmente ler (não apenas 'passar uma vista') meu antigo blog, vai se perguntar como eu ainda aguentei tanto tempo pra desabar, exercendo a nobre arte como eu exercia. É, 'exercia'. Porque eu vou voltar a exercer, mas daquela maneira, nem pro falecido papa!

P.S: E olha que eu amei aquele João Paulo II a ponto de rezar que ele descansasse de uma vez (aquilo não era mais viver, era sofrer). Basta contar quantas vezes eu comentei sobre ele naquela época.

Pros desavisados, o antigo blog começou com um grupo de amigos que foram parando de participar e acabou sendo só meu. Daí o 'De Lua e Estrela'.

2 comentários:

~Direto do Fim do Mundo~ disse...

Fiquei super interessada no livro que comentou o "memorias de um interno" tanto que baixei ele, ja que por aqui eu nao iria encontrar!! >_<
Vou comecar a ler hoje mesmo! ^_^
E de ficar surpresa ao ler o quanto voce trabalha de plantao e falar que nao ter dinheiro para o cinema.
Acho que eu tinha uma imagem distorcida sobre a carreira de um medico.
A realidade e um pouco diferente.

Odessa Valadares disse...

Na verdade, esse texto tem três anos e é do meu antigo blog. Eu não dou mais plantão por dinheiro algum nesse mundo. Preferi ser feliz.