... são feitos versos. Neruda era um ativista político e, como o mundo sempre luta pelos mesmos motivos, essa poesia é tão adequada hoje quanto há algumas décadas. Se você é o tipo de pessoa curiosa (como eu), aproveite e veja "O carteiro e O Poeta". E entenda como a política não impede o amor e vice-versa.
Talvez tenhamos tempo
Pablo Neruda
Talvez ainda tenhamos tempo
para ser e para ser justos.
De uma maneira transitória
ontem a verdade morreu
e embora o saiba todo mundo
o mundo todo dissimula:
nenhum de nós lhe mandou flores:
já morreu e não chora ninguém.
Talvez entre o olvido e o apuro
pouco antes de ser enterrada
teremos a oportunidade
de nossa morte e nossa vida
para sair por rua e mais rua,
de mar em mar, de porto em porto,
de cordilheira em cordilheira,
e sobretudo, de homem em homem,
perguntando se a matamos
ou foram outros que a mataram,
se foram nossos inimigos
ou nosso amor cometeu o crime,
porque já morreu a verdade
e agora podemos ser justos.
Antes deveríamos lutar
com armas de obscuro calibre
e por ferir-nos esquecemos
o porquê de estarmos lutando.
Nunca se soube de quem era
o sangue que nos envolvia,
nós acusávamos sem parar,
sem parar fomos acusados,
eles sofreram, e sofremos,
e quando já ganharam ele
se também nós quando ganhamos
a verdade tinha morrido
de antigüidade ou violência.
Agora não há o que fazer:
todos perdemos a batalha.
É por isso que eu penso, talvez,
por fim pudéssemos ser justos
ou por fim pudéssemos ser:
temos este último minuto
e logo mil anos de glória
para não ser e pra não voltar.
3 comentários:
Lindo poema e eu noto algo aí, uma certa nostalgia. Ou estou errada?
E "O Carteiro e o Poeta" é um de meus filmes favoritos...
Não seria exatamente pela beleza como se descreve a descoberta do prazer da escrita, do registro das próprias idéias? Sem a intermediação das palavras de terceiros, exatamente como essa aqui faz, citando os poemas e textos alheios?
Bem, há quem goste de citações. O nosso entomologista, por exemplo...
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