XLVIII
Da mais alta janela da minha casa
Com um lenço branco digo adeus
Aos meus versos que partem para a humanidade.
E não estou alegre nem triste.
Esse é o destino dos versos.
Escrevi-os e devo mostrá-los a todos
Porque não posso fazer o contrário
Como a flor não pode esconder a cor,
Nem o rio esconder que corre,
Nem a árvore esconder que dá fruto.
Ei-los que vão já longe como que na diligência
E eu sem querer sinto pena
Como uma dor no corpo.
Quem sabe quem os lerá?
Quem sabe a que mãos irão?
Flor, colheu-me o meu destino para os olhos.
Árvores, arrancaram-me os frutos para as bocas.
Rio, o destino da minha água era não ficar em mim.
Submeto-me e sinto-me quase alegre,
Quase alegre como quem se cansa de estar triste.
Ide, ide de mim!
Passa a árvore e fica dispersa pela Natureza.
Murcha a flor e o seu pó dura sempre.
Corre o rio e entra no mar e a sua água é sempre a que foi sua.
Passo e fico, como o Universo.
Alberto Caeiro (heterônimo de Fernando Pessoa)
Textos são como filhos: crescem e tomam vida própria. Vão aonde nunca nós (que o criamos) poderíamos supor, nos trazem grandes dores e insuspeitas alegrias. Só quem escreve, entende exatamente isso. Mães e pais têm uma pálida idéia, porque um filho tem metade de outro que não você. Um texto é só seu, e nada se compara à alegria de tê-lo diante de si. Ainda que ninguém jamais leia, que você nunca se resolva a compartilhá-lo, mesmo que ninguém publique. Ele é seu. Seu, e de cada um que o ame tanto (ou mais) que você.
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